Este blog está relacionado aos diversos projetos centrados na diversidade e pluralidade étnico-racial que desenvolvemos, sempre de forma coletiva e colaborativa, nas instituições educacionais e educativas onde atuamos como EDUCADOR, seja como professor, coordenador de núcleo educacional, assistente de diretor de escola ou diretor de escola.

Pois, consideramos de extrema importância, desde o início e durante todo o processo educacional, a proposição acerca da questão da IDENTIDADE, pois penso que o país e a sociedade, como um todo, só tem a ganhar com pessoas conscientes e bem resolvidas nesse contexto.

Acredito que esta FERRAMENTA, com os seus conteúdos e informações (textos, imagens, atividades entre outros), nos possibilitará acessar informações relativas ao que há de africano no Brasil, assim como referente ao continente africano, tão vasto e múltiplo, que pouco conhecemos aqui no Brasil.

Nos possibilitará também, valorizarmos a diversidade étnico-cultural, étnico-racial, a partir do debate, reflexão e estímulo a valores e comportamentos éticos como o amor, a amizade, o respeito, a solidariedade e a justiça, de forma que a todo o momento possamos nos posicionar contra qualquer forma de intolerância, e especificamente nos colocando contra todo o tipo de discriminação racial e a favor de práticas antirracistas.

12 março 2010

AÇÃO AFIRMATIVA (1)


Nesta entrevista exclusiva à Agência Carta Maior o professor Hélio Santos, doutor em Administração e mestre em Finanças pela Universidade de São Paulo (USP), professor da Universidade São Marcos (São Paulo) e da Fundação Visconde de Cairú (Bahia) e fundador e presidente do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo (1984), mostra que Políticas de Ação Afirmativa, como o sistema de cotas, não beneficiam os negros, mas, sim, o país, pois possibilitam a inclusão dos excluídos. Santos faz um mergulho na história do Brasil, lembra que imigrantes italianos e alemães também já foram alvo de políticas especiais em outras épocas e proclama: “não há política universalista que dê conta de ajustar o Brasil”. 
                      O que são políticas de ação afirmativa?
                     São políticas, públicas ou não, voltadas para populações que, em razão de motivos históricos, acumularam perdas. Essas políticas buscam reparar essas perdas. E uma coisa é certa: quem teve um bisavô negro acumulou perdas. Essas pessoas têm um crédito. O carma brasileiro da exclusão do negro deve acabar. A sociedade brasileira exclui com muita competência. Houve um zelo ibérico para excluir e um esforço parecido deve ser feito para incluir, sempre lembrando que as políticas de ação afirmativa não são para todo o sempre. Se forem bem aplicadas, podem deixar de existir em 30 anos. A sociedade terá alcançado um nível de homogeneidade que fará com que essas políticas sejam desnecessárias.

                   As políticas públicas universalistas ou generalistas, voltadas para toda a população, dão conta de propiciar um desenvolvimento social adequado e harmonioso?
Para responder a essa pergunta é preciso fazer uma síntese histórica. A escravidão durou 350 anos, a maior parte da história do Brasil, e a abolição, da forma como se deu, não propiciou uma igualdade efetiva. Entendeu-se, a partir de 14 de maio de 1888, que aqueles que tinham sido escravos por 350 anos eram precisamente iguais àqueles outros que nunca haviam sido escravizados. A partir daí, sem nenhuma ação especial, imaginou-se que a cidadania era de todos. Joaquim Nabuco dizia que terminar com a escravidão não era importante. O importante era terminar com os efeitos da escravidão. Nós internalizamos componentes subjetivos que estão ainda hoje colados à nossa alma. Não há política universalista que dê conta de ajustar o Brasil. Para todos nós, as políticas universalistas representam o que há de mais avançado, e quando se pede políticas específicas para os negros de certa forma colidimos com este ideal. Mas a dívida histórica do Brasil para com a população negra pode ser paga desta forma. Estas políticas apenas aparentemente beneficiam a população negra. Elas estão focadas nos negros, mas o benefício é coletivo. Pois o país adquire um componente de cidadania, deixa de ser historicamente inconcluso.  
Qual deve ser a abrangência destas políticas de ação afirmativa?
As políticas específicas estão no campo da educação, no mercado de trabalho, nos concursos, nas licitações. Na área da educação, a universidade é importante, mas não é onde está a maior parte de nossos problemas. Há uma população negra, especialmente masculina, que é formada basicamente por analfabetos funcionais, pessoas que foram até a 5ª, 6ª série no máximo, nunca se aproximaram de um computador, nunca leram um livro, poucos já foram ao cinema. São brasileiros ausentes, que estão incapacitados para exercer as funções mais modestas. Há que se ter políticas de capacitação dessa população não só para negros, claro – nesse caso, são políticas que eu classifico como PMI – políticas massivas de inclusão. Mas há outras que devem ser focalizados. Em todas as instâncias do Estado, do Itamaraty às Forças Armadas, há que se fazer um esforço para se colocar o negro. O Brasil, que tem 45% da população negra, tem que “tintar” os vários escalões. Mais uma vez faço um retrocesso histórico. Com o advento das ferrovias, em SP, se necessitava de trabalhadores fixos para fazer trabalho pesado, e o negro estava apto porque há um cacoete de que trabalhos que requerem força física são para negros. Pois estes negros se estabeleceram no interior, com emprego fixo, casaram, constituíram família, adquiriram casa própria. Nenhum deles virou milionário, mas as famílias se estruturaram e os filhos estão noutro patamar - a filha virou professora, o filho foi ser sargento do Exército, bancário. O que você vê hoje nas famílias negras nas cidades? São famílias desestruturadas, onde há sempre uma mulher liderando, muitas vezes com filhos de pais diferentes, uma auto-estima rebaixada, uma casa muito pequena, violência...Todo o terreno que conhecemos para esta tragédia urbana que é o Brasil.
Com tudo isso, quero dizer, que ao negro basta pouco: o emprego fixo já é suficiente para que ele demonstre essa capacidade de mobilidade social. Hoje o negro é discriminado mesmo no emprego modesto. Assim, os movimentos negros reivindicam, além de cotas em concursos públicos, que a presença de funcionários negros seja um quesito para participar de concorrências públicas. Nos EUA é assim: o Estado não tem como admitir tanta gente nem obrigar as empresas a contratar negros, mas a empresa que quiser vender para o Estado terá que admiti-los. As políticas públicas devem também trabalhar com a construção de uma estética, de uma identidade nacional. Você tem todo um país de mestiços focado num ideal estético que é escandinavo. Nossa identidade é um mosaico, é múltipla, rica, mas sonhamos com o linear. Temos um pomar com todas as possibilidades de frutas, mas insistimos em servir sempre uva Itália. Há que se fazer um esforço de políticas públicas nos meios de comunicação, refletindo nossa identidade – os adolescentes negros precisam se ver na mídia. Enfim, as políticas de ação afirmativa, que são as políticas específicas, são sofisticadas e não se restringem, como vem se colocando, à universidade.

Fonte: Agência Carta Maior - abril/2003

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iDcionário Aulete

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